Estudando sobre o topico "starter" tenho resolvido muitas duvidas e criando outras..rs
Como meus últimos tópicos ficaram longos demais e acredito que ficou "anti-didatico" criei esse mais especifico sobre um duvida especifica e direta.
Segundo o material em anexo escrito pelo Jamil Zainasheff devemos propagar a levedura em temperaturas de 18 a 24 graus... usando algo próximo a 18 para lagers e 24 para ales...
Seguindo essa logica resolvi não negligenciar esse detalhe e quero controlar a temperatura de propagação.(o verão ta batendo os 40 por aqui..rs)
minha duvida: Se irei controlar a temperatura do "starter" dentro da minha geladeira , devo utilizar o sensor colado no erlen como usaria para controlar as fermentaçoes ou posso setar uma temperatura ambiente um pouco mais baixa e não me preocupar com isso?
Parece uma resposta simples... mas temos que levar em consideração alguns detalhes...
1- Durante o Starter assim como em todo resto do processo fermentativo não é interessante grandes variaçoes de temperatura.
2- Durante o processo temos algumas variáveis liberando calor para o meio de propagação... As leveduras quebrando açucares e o proprio stir plate.
3- Devido ao uso do agitador, temos o mosto sempre em movimento que gera grande troca térmica entre o mosto e a temperatura do ambiente.
4- Inercia termica do refrigerador em relação ao frasco de propagação.
Então confrades, sei que parece preciosismo...mas cerveja é feita de um monte de detalhes que juntos fazem a diferença.
Não sei se cheguei muito tarde na conversa, mas vou tentar deixar uma contribuição.
Para responder suas perguntas eu preciso antes estipular duas situações distintas: 1 - Você quer fazer starter para atingir pitching rate para fazer cerveja na sua casa. 2 - Você quer fazer uma pesquisa científica ou banco de leveduras em um laboratório no qual vai expor suas leveduras a estresse severo de temperatura.
Caso 1 - eu particularmente não controlo a temperatura do starter se a temperatura ambiente estiver entre 25 e 35ºC. Essa faixa de temperatura é realmente boa para o starter e não me importo tanto com variações de temperatura nessa faixa, pois não faz sentido se preocupar com off-flavors do starter, pois o volume dele no geral chega a no máximo 10% do volume da cerveja e o mosto ainda será fermentado, o que dilui totalmente qualquer problema que possa existir no stater. Outro ponto é que leveduras existem na natureza e elas são preparadas para suportar estresses térmicos, na verdade, em termos de saúde e comportamento, existem 2 marcos: 45ºC e 7ºC, que são temperaturas em que a levedura começa a acumular muita trealose para manter a integridade da parede celular frente a estresse térmico. Variações de 10/15ºC entre esses valores, principalmente distantes desses marcos, não afetam a saúde da levedura, mas favorecem o aparecimento de Off-Flavors. Portanto eu realmente não me importo com isso.
Uma informação a título de curiosidade: Eu gosto de entender bem o comportamento da levedura no mosto, então toda vez que preparo a levedura em laboratório (temperatura sempre muito bem controlada) quando faço a purga do starter para congelar ou liofilisar, sempre guardo o liquor (aquele mosto do stater) e faço "cerveja" dele. Uma vez que o perfil do DME fermentado é muito limpo e não tem lúpulo, a "cerveja" resultante possui bastante sabor característico de subprodutos da levedura. Nunca notei variação considerável de ésteres, por exemplo, entre starters feitos a 25ºC e 30ºC, os de 35ºC até já notei em Vermont, que dá um sabor e aroma muito ruim de epocler de abacaxi, embora tenha sido um dos mais contundentes que já obtive, ele nunca (NUNCA MESMO) apareceu em nenhuma cerveja que fiz starter de Vermont sem controle de temperatura na faixa que te falei.
Em resumo, de tudo isso que te falei, eu particularmente não vejo problema algum em não controlar temperatura de starter. Só fique atento para o momento certo de inocular ele na cerveja, que será mais rápido quando estiver com temperaturas batendo na casa dos 35ºC
Caso 2 - O caso de você ter que controlar a temperatura para fazer experimento é bem sensível. Nesse caso você vai precisar de freezer próprio para isso que regula a temperatura com uma histerese bem pequena. Ou no caso de lab sem recurso, o jeito é mergulhar o controlador de temperatura dentro do starter. Vamos supor que você não precisa de tanta precisão e tem um starter de 5 litros, nesse caso você não tem uma inércia térmica tão considerável assim, na verdade como ele vai estar em rotação constante, a troca de calor com o ambiente externo é muito grande, e em uma geladeira mais fria você terá um gradiente de temperatura considerável, logo não tardará a entrar em equilíbrio térmico. portanto se você deixar o controlador de temperatura colocado na parede externa do Erlen vai funcionar tranquilamente. Nesse contexto eu não entendi exatamente sua pergunta 4, pois o que o pessoal da engenharia chama de "inércia térmica" é a relação entre a capacidade térmica volumétrica e a condutividade térmica, então não existe inércia térmica do refrigerador em relação ao Erlen do starter, o que existe é a inércia térmica do starter e a da geladeira, que são coisas distintas. De maneira bem simplista, a inércia térmica se comporta exatamente igual a inércia da mecânica Newtoniana, na qual é a dificuldade em se variar o estado de movimento retilíneo uniforme de um corpo, aqui a inércia térmica é a dificuldade de você variar a temperatura do corpo uma vez que ela está em equilíbrio térmico. Logo o refrigerador vence a inércia térmica do Erlen (não do starter), fazendo o mesmo entrar em equilíbrio térmico com o refrigerador, nesse momento a geladeira desliga o compressor e então dois processos ditam a dinâmica da situação: o primeiro é que o seu starter vai roubar calor da parede do Erlen e o segundo é a perda de calor do interior da geladeira para o ambiente externo. Essa briga ficará por algumas horas até que a parede do Erlen entre em equilíbrio térmico com o starter e a geladeira passe a ter perdas apenas para o ambiente externo. Nesse caso você irá garantir que a parede do Erlen sempre esteja na temperatura correta, porém starter rapidamente entra em equilíbrio térmico com ela, primeiro porque é pouco quantidade, segundo porque sua geladeira ficará praticamente em temperatura constante a depender da sua histerese, e terceiro porque seu agitador está sempre aumentando a superfície de contato do mosto do starter. Logo não tem problema colocar o sensor na parede do Erlen e você não precisa se preocupar com inércia térmica de starter. Para ser sincero, você precisa se preocupar com inércia térmica da sua cerveja, sendo cervejeiro caseiro, em poucas situações, uma delas é pra não congelar sua cerveja em alguns freezers.
Respondendo a pergunta 2: Sim, o processo fermentativo é exotérmico devido a quebra da glicose e fornece cerca de 120 kJ/mol de glicose. Como o consumo não é linear a temperatura varia durante a fermentação. No caso, considerando um pico fermentativo em que suas leveduras consomem cerca de 60% do açúcar fermentável do seu mosto em um starter de 5 L com OG de 1,036 SG (9 ºP), você teria a seguinte equação:
mol de Glicose = (5L*1.036SG*0,09)/0,18 = 2,59 mol de glicose
Consumindo 60% desse valor você tem 1,55 mol que fornece:
1,55*120kJ/mol = 186,5 kJ.
Agora vamos ver o quanto isso consegue aquecer seu mosto. Inicialmente vamos pensar que essa etapa ocorreu nas primeiras 12h de fermentação e que o consumo foi linear (Claramente não foi linear, ela consome em uma taxa variável descrita por uma equação diferencial de primeira ordem que não cabe ser discutida aqui - é algo que parece quasi-exponencial), então a cada hora seriam consumidas
186,5kJ/12h = 15, 5 kJ/h
Vamos agora calcular o valor (bem aproximado) para a quantidade de calor produzido em 1h. O calor específico do mosto costuma variar entre 4 e 4.1 kJ/kgK, então usando Q = m*c*Delta T, com Q = 15,5 kJ, c = 4.1 kJ/kgK, m= 5,3 Kg (considerei que densidade do mosto como
1060 kg/m3), vamos encontrar a variação de temperatura Delta T:
Delta T = Q/m*C = 15,5kJ/(5,3 Kg*4.1 kJ/kgK) = 0,71 K
Ou seja, tirando uma média do que sua levedura consome durante o pico do processo fermentativo, a quebra da glicose conseguiria subir sua temperatura uma taxa de 0,7/0,8 ºC por hora em um ambiente adiabático, como você terá perda de energia para o ambiente externo da geladeira, o calor gerado durante a fermentação em nada interfere no que você precisa.
Espero ter ajudado.
Att.